Espiritualidade invisível em The Returned

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Cena de "Les Revenants" Mencionei outro dia a impressionante trilha sonora da série The Returned (→ Trilha da série Les RevenantsTrilha da série Les Revenants
Nunca tinha ouvido falar da série francesa Les Revenants (The Returned, de 2004). Fiquei sabendo por ser fã da banda instrumental Mogwai, que compôs uma trilha sonora linda (dica: ouça ou baixe no Freetube → Vídeos do Youtube sem entregar…
). Agora estou hipnotizado é pelo seriado em si.

A história é sobre uma vila francesa onde os mortos começam a voltar como se nunca tivessem morrido. Não tem a ver com zumbis, é um suspense essencialmente psicológico e atmosférico.

Também é um prato cheio sobre "questionamentos filosóficos", já que a morte é um dos grandes e intermináveis enigmas existenciais da humanidade.

O que mais me chamou a atenção na história — que é apresentada de modo completamente crível: o fato de mortos estarem voltando fica sendo algo bem razoável —, é a "espiritualidade invisível" das personagens. As pessoas que voltam não se lembram de nada que teria acontecido no "além", nem da própria morte. Também não possuem nenhuma experiência espiritual extra, devido ao ocorrido. São exatamente como nós, sendo movidas por suas paixões e histórias pessoais. O autorreconhecimento de que são pessoas "mortas" só vem devido ao que os vivos lhes dizem, e à lacuna em sua memória. A tensão que se arma parece mais social do que espiritual.

Fiquei pensando que, basicamente, nós também somos assim. Não temos contato direto com nenhuma "realidade superior" além dos sentidos. Temos conceitos e crenças.

Apesar de não escrever muito sobre isso, não me considero ateu nem agnóstico. Resumidamente, acredito em uma "realidade maior" da qual somos simultaneamente parte e expressão. Essa realidade é simplesmente a existência — apesar de ela não ser nada simples. Geralmente a consciência que temos dela é muito limitada, superficial e distorcida. A experiência mais expandida da realidade — que vai além do ponto de vista individual — costuma ser interpretada com tons espirituais e religiosos. E tudo bem. O problema é quando se perde de vista a natureza metafórica das histórias espirituais e as religiões viram fundamentalismo e intolerância.

Então voltando ao seriado, as pessoas mortas que retornaram não têm nenhuma consciência ou experiência direta de algo transcendente. Mas, ao mesmo tempo, a transcendência da morte está ali escancarada. Para mim, a grande sacada desse seriado é transmitir essa ideia sem nenhum "espiritualismo" ou até mesmo moralismos.

Ainda não cheguei ao fim e não sei qual é a resposta para o mistério, mas acho que não precisaria de um desfecho explícito, daqueles que explicam tudo.