Todos Nós Desconhecidos (All of Us Strangers, 2024) foi um dos filmes mais tocantes que vi recentemente. Drama despedaçador, que até me fez repensar uma antipatia: não gosto de histórias que colocam o amor romântico no centro da existência.
Mesmo quando tinha menos de 30 anos — idade em que costumamos acordar desse romantismo —, já não tinha paciência. Agora entendi um outro ângulo.
No filme, Adam encontra um parceiro em um grande prédio vazio — são os únicos moradores.
Ele está escrevendo sobre seu pai e mãe, que morreram quando era criança. Mas, ao visitar a antiga casa, lá estão eles como se nada tivesse acontecido.
Um tema central é o poder incapacitador do trauma, da perda. Isso se liga também à não aceitação social da homossexualidade, da falta de suporte familiar.
O que me deixou pensando é que o amor romântico é sim um bálsamo para as feridas abertas de traumas severos, como o filme sublinha. Como já vivemos num tipo de "sociedade do trauma", nada mais justificável do que a busca desesperada por alívio.
Pra mim, basta uma única cena genuinamente memorável para sempre lembrar de um filme. Todos Nós Desconhecidos têm algumas. A cena que mais me tocou foi a da árvore de natal. Nunca imaginei que a versão de "Always on my mind" dos Pet Shop Boys poderia ficar tão linda — tinha uns doze anos quando essa música estourou e a odiava (porque meu irmão amava, e eu gostava era de rock).
Na cena, a mãe (que havia revelado certa homofobia) cantarola junto para o filho, em uma velada e tímida expressão de amor incondicional, semi-consciente:
Maybe I didn't treat you, Quite as good as I should have
Maybe I didn't love you, Quite as often as I could have
Little things I should have said and done, I just never took the time
You were always on my mind…
Maybe I didn't hold you, All those lonely, lonely times
And I guess I never told you, I'm so happy that you're mine
If I made you feel second best, Girl, I'm so sorry I was blind
You were always on my mind…
(tradução)
Ele percebe e se delicia como uma criança que finalmente ganha o presente sonhado. Essa cena transmite tanto, sem nem usar diálogos!
O filme é certeiro ao retratar o romance como uma das faces de uma experiência maior, englobando família e muitíssimo mais (como sugere o final). Assim, entrega também uma dose perfeita de espiritualidade, profunda e sem moralismos.
O final é bem aberto, levando a diversas interpretações e reflexões.
Inesquecível.
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