Trecho do livro O Decênio Decisivo (2023), de Luiz Marques:
O título do relatório de 2019 do Institute for Public Policy Research (IPPR), de Londres, chama corajosamente nossa época pelo seu nome: “a idade do colapso ambiental” (the age of environmental breakdown). Eis o que é essencial compreender sobre o colapso socioambiental em curso:
o colapso ambiental não é um evento com data marcada para ocorrer. Trata-se do processo em que estamos. Esse processo é sutilmente pontuado por sucessivos estágios de agravamento em intensidade, amplitude e frequência de suas manifestações e impactos. Mais importante que tudo: embora gradual, essa sucessão de estágios se caracteriza por sua aceleração e por evoluir de modo não linear (e tendencialmente exponencial), condicionada que é por inúmeras alças de retroalimentação. Disso decorre a certeza de que, mantida a atual trajetória, a situação das sociedades ao final deste decênio será (muito) mais crítica do que em seu início;
a principal consequência dessa aceleração é que o tempo se torna, aos poucos, a principal variável na avaliação dos riscos. O tempo é, hoje, nosso maior inimigo. Como afirmado na seção anterior, a especificidade de nosso tempo reside justamente em nossa decrescente capacidade de mitigar os crescentes desequilíbrios dos sistemas físicos e biológicos. Portanto, na ausência de uma mudança de trajetória radical e imediata, ou de curtíssimo prazo, as ações humanas voltadas para a reversão desse processo precisarão ser cada vez mais radicais e serão cada vez menos efetivas, até se tornarem, caso continuem a ser retardadas, quase irrelevantes;
mudar nossa trajetória de colapso requer não apenas parar de destruir a natureza agora, mas nos empenhar em reconstruir, na medida do possível, o que foi destruído desde ao menos a década de 1950. Se os últimos setenta anos foram os anos da “Grande Aceleração”, ou seja, da “Grande Destruição”, os próximos decênios terão de ser os da “Grande Restauração”. É preciso apostar que isso ainda é possível. Essa aposta é, contudo, razoável se, e somente se, como indivíduos e como sociedade globalmente organizada, reagirmos com presteza e à altura do que exige agora a emergência climática e demais emergências socioambientais.