A utopia de Becky Chambers

>

Capa de "A Psalm For The Wild Built"

Já tinha uns meses que marquei para ler Becky Chambers, principal autora do subgênero de ficção científica "HopepunkHopepunk
Fiquei curioso. "Hopepunk" é um novo gênero de ficção científica onde o bem predomina. Apesar de precisarmos da ficção para conseguir imaginar isso, me identifico totalmente com a premissa. Trecho de uma reportagem na Wired sobre a autora Becky Chambers:…
". Sigo no Mastodon a tag #scifi e vi vários elogios a Becky recentemente, o que me motivou a ler Salmo para um Robô Peregrino (A Psalm for the Wild-Built, 2021).

O livro ganhou o prêmio Hugo de 2022, um dos mais importantes da ficção científica. Tecnicamente é uma "novela" — dá para terminar numas três horas —, sendo o primeiro da dupla Monk & Robot. Becky já havia ganho o Hugo pela série anterior Wayfarers.

Tenho certa preguiça de novos rótulos e gêneros artísticos — por exemplo, nunca entendi bem o tal de "new weird" atribuído a Jeff Vandermeer (→ A natureza alienígena de Jeff VandermeerA natureza alienígena de Jeff Vandermeer
(ilustração de Armando Veve, para o conto This World is Full of Monsters) Coincidentemente, passei uns meses meio imerso num universo de fungos e cogumelos. Além do seriado The Last of Us, li a trilogia Ambergris, de Jeff Vandermeer (reunida…
), para mim é só ficção científica.

Mas assim como "solarpunk" — outra forma de definir a obra de Becky Chambers — "hopepunk" é um conceito fascinante. O "punk" é de contestação, desafiando radicalmente o sistema vigente — como a resistência de guerrilha às megacorporações que permeia as ficções cyberpunk. Hopepunk, basicamente, são histórias otimistas sobre a natureza e sociedade humanas, sobre utopias bem palpáveis e possíveis, que retratam a bondade de um modo que acaba sendo corrosivo e subversivo para o sistema opressor.

No entanto, senti falta do "punk" nesse livro A Psalm for the Wild-Built. É algo tão gentil e compassivo que chega a ser singelo. Não estou acostumado com histórias desse tipo. É quase bizarro. Estranhei mesmo. O curioso é que realmente gostei, mas por outros motivos.

É basicamente uma ficção científica utópica que discute o senso de propósito para a existência, envolvendo natureza, espiritualidade pós-apocalíptica e o que é a consciência ou vida, já que um personagem-chave é um robô.

Talvez eu tenha estranhado a história porque nessa utopia não há nenhum grande mal. Como manter o apelo da narrativa sem ameaça, conflito, vilões? Os conflitos são todos internos. E me identifiquei completamente. Já estão na fila os outros livros de Becky.