… estamos em um período de excesso de centralização. É demonstrável que, em muitas funções, esse estilo é economicamente ineficiente, tecnologicamente desnecessário e humanamente prejudicial. Portanto, devemos adotar uma máxima política: descentralizar onde, como e quanto for conveniente. …
Isso não é "anarquia". (Mas é claro que a maioria dos anarquistas, como os anarco-sindicalistas ou os anarquistas comunitários, também não têm sido "anarquistas", mas descentralistas).
Paul Goodman (em 1964)
Ursula Le Guin (Ficção anarquista de Ursula K. Le GuinFicção anarquista de Ursula K. Le Guin
Os Despossuídos (1974), de Ursula K. Le Guin, costuma ser apontado como o grande clássico da ficção anarquista (eu colocaria na lista também The Fifth Sacred Thing, de Starhawk, e o recente Walkaway, de Cory Doctorow). Ursula se consagrou como…) foi quem me levou a ler Paul Goodman (1911 — 1972), referindo-se a esse autor estadunidense como sua maior influência anarquista. Já o historiador George Woodcock, autor de uma história canônica do anarquismo (Anarchism, 1962), chamou Goodman de "o único pensador libertário verdadeiramente seminal de nossa geração".
Drawing the Line Once Again: Paul Goodman's Anarchist Writings é um livro curto que reúne artigos sobre temas ligados ao anarquismo. Talvez não seja o melhor livro para introduzir o autor. Senti muitos dos artigos meio datados: como não foram pensados originalmente como um livro, fazem referências frequentes e até usam como gancho notícias da época, por exemplo.
Mas a análise afiada e o pragmatismo são exemplares, como no artigo abaixo (reproduzido numa tradução automática revisada), o que mais gostei.
É sobre um princípio básico do anarquismo, a descentralização em (quase) todos os níveis. Respondendo a perguntas frequentes de jovens, Paul introduz como isso de fato poderia ser implementado.
Algumas objeções iniciais ao descentralismo
Paul Goodman, dezembro de 1964
(tempo de leitura: 29 min)
Em toda a nossa sociedade, um estilo centralista de organização tem sido estimulado tanto a ponto de se tornar ineficaz e desperdiçador, humanamente entorpecente e arrasador para a democracia. É assim no indústria, no governo, nos sindicatos, nas escolas e na ciência, na cultura e na agricultura. E o estreito entrelaçamento dessas organizações centralizadas criou, em minha opinião, uma situação crítica. A ação modesta, direta ou independente tornou-se extremamente difícil em quase todas as funções da sociedade. No momento, precisamos de uma forte combinação de descentralização; o problema é onde, quanto e como obtê-la.
Em um sistema centralizado, a função a ser desempenhada é um objetivo da organização, e não de qualquer pessoa (exceto quando ela se identifica com a organização). As pessoas são os funcionários. A autoridade é de cima para baixo. As informações são coletadas de baixo para cima, em campo, e processadas para que possam ser usadas pelos que estão acima. As decisões são tomadas na sede, e a política, o cronograma e o procedimento padrão são transmitidos para baixo pela cadeia de comando.
A empresa como um todo é dividida em departamentos de operação para os quais os funcionários são designados com funções distintas, a fim de proporcionar um desempenho padrão. Esse é o sistema da loja de departamentos do sr. Goldwater, dos governos federal e estaduais, da maioria das instituições de ensino fundamental e superior, da CIO (gerência de TI), dos hospitais, da renovação de bairros, da rede de radiodifusão e dos acordos que as cadeias de supermercados fazem com os agricultores. O sistema foi projetado para disciplinar exércitos, para manutenção de registros burocráticos e cobrança de impostos, e para certos tipos de produção em massa. Agora, ele se disseminou por todas as áreas.
O princípio do descentralismo é que as pessoas se engajam na função que desempenham; a organização é como elas cooperam. A autoridade é delegada para longe do topo, tanto quanto possível, e há muitos centros de decisão e elaboração de políticas. As informações são transmitidas e discutidas em contatos face a face entre área de atuação e sede. E cada pessoa fica ciente de toda a operação. Ela trabalha da sua própria maneira, de acordo com suas capacidades. Os grupos organizam seus próprios horários. Historicamente, esse sistema de associação voluntária produziu a maioria dos valores da civilização, mas acredita-se que ele seja totalmente impraticável nas condições modernas, e o próprio modo como soa é estranho.
Agora se, ao dar uma palestra em uma faculdade, eu mencionar que alguma função da sociedade, que é altamente centralizada, poderia ser bastante descentralizada sem perda de eficiência ou talvez com um ganho, imediatamente os alunos não querem falar de outra coisa.
Essa insistência deles costumava me surpreender, e eu a testei experimentalmente ao colocar sorrateiramente alguma observação descentralista durante palestras sobre assuntos totalmente diferentes. Os alunos se agarraram ao comentário infalivelmente. Em suas perguntas, por vinte minutos eles poderiam seguir o tema principal — pacifismo nuclear ou até mesmo a revolução sexual, por exemplo — mas voltavam à descentralização por muitas horas, atacando-me com ceticismo, objeções acaloradas ou perguntas difíceis.
Pelo tom delas, fica claro que de algum modo sua existência está em jogo. Eles se sentem presos no sistema atual da sociedade, que lhes concede tão pouca voz ou iniciativa e isso, na verdade, é o modo do ensino que vêm apoiando por doze a dezesseis anos. A inquietação e o sarcasmo mordaz significam que, se a descentralização é possível, então eles se resignaram desnecessariamente; eles defendem ardentemente a opção de 2º lugar que escolheram. Mas a seriedade e as perguntas difíceis são feitas em um tom de esperança cética de que eu seja capaz de resolver todas as dificuldades. Se, em algum momento, eu confesso que não sei a resposta, os alunos imediatamente inventam respostas para mim, para provar que a descentralização afinal é possível.
Naturalmente, em todas as faculdades, passamos pelo mesmo assunto. A própria uniformidade da discussão é uma evidência desanimadora de que o estilo centralista existe como uma superstição de massa, nunca antes questionada na mente dos alunos. Se eu apontar algum defeito comum de qualquer sistema centralizado, e isso saltar aos olhos no modo como sua própria faculdade se organiza, serei considerado um sábio ousado demais. Eles consideram como certo que não pode haver outro método de organização.
Portanto, vamos discutir aqui essas objeções preliminares usuais.
A descentralização não é falta de ordem ou planejamento, mas um tipo de coordenação que se baseia em motivos diferentes de integração e coesão do que a direção de cima para baixo, regras padrão e recompensas externas, como salário e status. Ela não é "anarquia". (Mas é claro que a maioria dos anarquistas, como os anarco-sindicalistas ou os anarquistas comunitários, também não têm sido "anarquistas", mas descentralistas).
Exemplo da ciência
Como exemplo de coordenação descentralizada, o príncipe anarquista Kropotkin, que era geógrafo, costumava apontar de forma espetacular para a história da ciência ocidental desde a era heroica de Vesalius, Copérnico e Galileu até sua própria época de Pasteur, Curie, Kelvin e J. J. Thomson.
O progresso da ciência, em todos os ramos, foi primorosamente coordenado. Havia associações voluntárias, publicações, conferências regionais e internacionais. O sistema de doutorado garantia que as novas pesquisas fossem rapidamente divulgadas em várias centenas de bibliotecas universitárias. Havia correspondência privada contínua, mesmo entre fronteiras em guerra. No entanto, nesse vasto empreendimento comum, tão surpreendentemente produtivo, não havia nenhuma direção central.
O principal vínculo de coesão, é claro, era o fato de que todos os cientistas tinham o objetivo comum de investigar a natureza, além de suas rivalidades pessoais ou de grupo. A delicada integração de esforços ocorria porque eles acompanhavam os novos dados ou trabalhavam com as teorias de ponta. Era quase unicamente raro — o caso de Mendel é famoso, até onde sabemos — que um trabalho importante ficasse de fora do diálogo.
A maioria dos outros grandes valores objetivos, como a beleza ou a compaixão, também prosperou por meio da associação voluntária e da solidão independente (embora a técnica da salvação teológica tenda a ser centralista). Quase que por definição, o progresso da justiça social se deu por meio de associação voluntária, já que a autoridade central é a que se rebela. E, é claro, para preservar a liberdade, o sistema político americano foi deliberadamente concebido como uma polaridade de organizações centralistas e descentralistas, limitando o poder do Soberano e com controles e equilíbrios incorporados em todos os níveis.
Mas também devemos lembrar que, em seu período inicial, celebrado por Adam Smith, o sistema de livre iniciativa de parcerias e atentos grupos de acionistas era, em teoria, um modelo de coordenação descentralizada, em oposição ao sistema centralizado do mercantilismo, das patentes reais e dos monopólios, que ele substituiu.
Ele depositava uma confiança absoluta na associação voluntária e na influência coesa de forças naturais: o Homem Econômico e as Leis do Mercado. Logo, porém, os acionistas deixaram de cuidar dos negócios e se tornaram investidores ausentes ou até mesmo apostadores da bolsa de valores. E quase desde o início, neste país, principalmente nos setores bancário e tarifário, houve um renascimento dos monopólios estatais.
Critérios para descentralização
Um aluno pergunta: "Mas como é possível descentralizar o controle de tráfego aéreo?"
Não é possível. Muitas funções são centrais por sua natureza. Vou enumerar rapidamente alguns dos principais tipos. (O processo e o uso da centralização são, por si só, um assunto fascinante, mas este artigo trata das deficiências da centralização, não de suas virtudes).
A autoridade central é necessária quando não há limites distritais e algo positivo deve ser feito, como no controle de epidemias ou de poluição atmosférica, ou quando uma decisão arbitrária é necessária e não há tempo para reflexão, ou quando temos de definir padrões arbitrários para todo um campo, mas os padrões específicos são indiferentes; por exemplo, pesos e medidas, ou moeda.
A centralização é temporariamente necessária quando uma emergência exige a concentração de todos os poderes em um esforço conjunto. (Nesse caso, a alternativa descentralizadora seria se dispersar ou se esconder.) Mas a história mostra que a centralização de emergência pode ser fatal, pois a organização centralizada tende a sobreviver à emergência e, então, sua própria existência cria uma emergência crônica: as pessoas logo ficam impotentes sem sua direção.
A autoridade central é conveniente para realizar funções rotineiras ou "meramente" administrativas quando temos coisas mais importantes para fazer. Essa é a teoria marxista da redução do Estado à "mera" administração. Mas isso também pode ser fatídico, pois a administração logo se sobrepõe a todo o resto. É assim que o "secretário executivo" de uma organização acaba comandando o espetáculo.
A organização central é a mais racional quando a logística de uma situação supera a consideração das particularidades envolvidas. Esses são todos os casos de emissão de bilhetes e cobrança de impostos, em que uma pessoa é igual a outra; ou a produção e distribuição em massa de um item padrão que é bom o suficiente e que todos precisam.
Além disso, há monopólios que precisam ser regulamentados e licenciados pela autoridade central (ou nacionalizados). Alguns monopólios são naturais ou se tornam assim devido às circunstâncias, como o abastecimento de água urbano. Algumas empresas se tornam monopolistas porque são tão fortemente capitalizadas que a concorrência é proibitivamente arriscada ou desperdiçadora. Elas crescem até se tornarem a natureza inevitável das coisas e, então, devem ser tratadas dessa forma. Por exemplo, as ferrovias da Europa foram planejadas e construídas de forma descentralizada, com acordo voluntário sobre bitolas e horários; mas, por fim, como monopólios, foram nacionalizadas e parcialmente internacionalizadas.
Minha tendência é descentralista, mas em algumas funções acho que precisamos de mais centralização do que temos. Por exemplo, deveria haver padrões modulares uniformes em materiais e acessórios de construção. A construção civil é um exemplo típico de como fazemos as coisas ao contrário: onde deveria haver descentralização — no projeto que exige arte e na decisão de cada bairro sobre como ele quer viver —, temos um projeto burocrático ou de cumprimento de rotinas, e o padrão da ausência de sociólogos ou os lucros de um empresário.
Mas onde poderia haver uma economia importante — em materiais e no processo de construção; por exemplo, na produção em massa de um banheiro padrão — não padronizamos.
Da mesma forma, deveria haver uma padronização das peças e do design de máquinas, especialmente para aparelhos e carros domésticos, para facilitar reparos. Ou, de novo, é certamente absurdo que o dispendioso empreendimento de exploração espacial seja competitivo internacionalmente, em vez de um planejamento central com trabalhos por departamento, com equipes e honras partilhadas.
Por fim, as tecnologias de automatização e de computadores são, por natureza, altamente centralistas em seu estilo e em suas aplicações, e esse é um fenômeno massivo do presente e do futuro imediato. Onde for relevante, essa tecnologia deve ser maximizada o mais rápido possível e muitas dessas fábricas devem ser tratadas como monopólios. Mas talvez o problema mais profundo que a sociedade moderna enfrenta seja decidir em quais áreas o estilo automático e computadorizado não é relevante e, nesse caso, restringi-lo ou eliminá-lo.
Um estudante marxista objeta que a divisão do trabalho, a opção local, a comunicação face a face e outras posições descentralistas são relíquias de uma ideologia camponesa, provinciana e não liberal.
De fato, sempre houve duas vertentes no pensamento descentralista. Alguns autores, como Lao-tse ou Tolstoi, fazem uma crítica camponesa e conservadora da corte e da cidade centralizadas como sendo inorgânicas, verbais e ritualísticas. Mas outros autores, como Proudhon ou Kropotkin, fazem uma crítica democrático-urbana da burocracia e do poder centralizados, incluindo o poder feudal-industrial, como sendo exploradores, ineficientes e desencorajadores da iniciativa.
Em nossa era atual de socialismo de estado, feudalismo corporativo, ensino regulado, comunicação de massa com lavagem cerebral e anomia1, ambos os tipos de crítica fazem sentido. Precisamos reavivar a autossuficiência dos camponeses e o poder democrático dos grêmios ("guilds") profissionais e técnicos.
Qualquer descentralização que pudesse ocorrer atualmente seria inevitavelmente pós-urbana e pós-centralista; não poderia ser provinciana. Não há nenhum americano que não tenha sido formado pela TV nacional e nenhuma região que não tenha sido homogeneizada pelas estradas e cadeias de lojas.
Um modelo de descentralização atual é o kibutz israelense. Alguns diriam que essa comunidade voluntária é fanática, mas ninguém negaria que ela é cosmopolita e racionalista; é pós-centralista e pós-urbana.
A descentralização tem seus riscos. Suponhamos que o sistema escolar de uma cidade do norte fosse radicalmente descentralizado, entregue aos pais e professores de cada escola. Sem dúvida, algumas das escolas seguiriam a linha de John Birch e outras seriam muito negligenciadas. No entanto, é difícil imaginar que muitas escolas seriam piores do que o atual denominador mínimo comum.
Certamente haveria mais experimentação. Haveria outras opções significativas para as quais mudar, e seria possível fazer com que todas as escolas existissem em uma estrutura de padrões gerais que elas teriam de atingir ou sofreriam as consequências.
Direitos dos estados
Invariavelmente, algum aluno argumenta que, sem a intervenção do governo federal, as pessoas negras do Sul nunca obterão seus direitos civis. Isso pode ou não ser verdade, mas certamente a maior parte do progresso em direção aos direitos civis veio de ações locais que constrangeram e pressionaram Washington. E as próprias organizações negras têm sido coordenadas de forma descentralizada; como o dr. (Martin Luther) King apontou, a "liderança" segue continuamente as localidades.
Mas o erro básico desse estudante é considerar que os "direitos dos estados" segregacionistas estão descentralizados (embora um regionalismo autêntico possa ser descentralista). Se cada localidade de fato tivesse sua opção, os condados onde pessoas negras são maioria teriam regras muito diferentes! E, novamente, haveria boas opções para outros negros se mudarem.
A relação da descentralização com a mobilidade física e social é um tópico importante; vamos ficar nele mais outra página. Como o exemplo da ciência demonstrou, é possível ter uma comunidade descentralizada sem uma comunidade territorial. No entanto, as filosofias descentralistas têm valorizado a estabilidade, o "enraizamento" — a consciência sutil do ambiente — como um meio para a integração das funções domésticas, técnicas, econômicas, políticas e culturais da vida, e para proporcionar uma comunidade física na qual os jovens possam crescer.
Os americanos sempre foram rápidos em formar associações voluntárias — Tocqueville menciona essa característica com admiração. No entanto, os americanos sempre tiveram mobilidade, geralmente indo embora — indivíduos e famílias deixando comunidades que não ofereciam oportunidades suficientes para experimentar um novo território, conhecido apenas por boatos.
Historicamente, o país era aberto nas margens, devido à fronteira geográfica ou a novos empregos que atraíam imigrantes. Quando as pessoas se estabeleciam, elas formavam novamente associações voluntárias. Assim, até certo ponto, a mobilidade voluntária favoreceu a descentralização. Por outro lado, os novos laços e assentamentos tenderam a se tornar mais homogêneos e nacionais.
Atualmente, no entanto, o país está fechado nas margens, mas a mobilidade física (e social) é ainda maior. Pessoas negras migram para o norte porque o cultivo compartilhado fracassou e eles são impedidos de entrar nas fábricas; os brancos de classe média do norte se mudam para os subúrbios para fugir dos negros; as famílias de agricultores diminuíram para 8%.
Tragicamente, nenhum desses grupos está se movendo para lugar nenhum. E grande parte das mudanças é ordenada pela própria organização central; as corporações nacionais enviam seus funcionários e famílias para esta ou aquela filial; as universidades disputam funcionários entre si; marqueteiros e burocratas deslocam os inquilinos para o redesenvolvimento urbano.
Esperança da comunidade
Se negligenciadas, essas condições devem acabar em anomia completa, com falta de relação significativa com o meio ambiente e a sociedade. Parece haver duas alternativas de solução. Uma delas foi proposta há quarenta anos por Le Corbusier: centralizar e homogeneizar completamente, de modo que um local de moradia seja exatamente igual a outro, com móveis, serviços e ambientes idênticos. Quando todos moram em quartos de hotel idênticos, a mobilidade não envolve deslocamento de fato.
A outra alternativa é construir comunidades em que a associação voluntária significativa seja novamente possível, ou seja, descentralizar. Esse tem sido, é claro, o objetivo melancólico do suburbanismo, e aparece continuamente nos anúncios de imóveis. Mas um subúrbio não é uma comunidade descentralizada; seus objetivos, modo de vida e decisões são determinados pela sede da empresa, pelo padrão de vida nacional e pelo departamento de rodovias. A esperança da comunidade está no fato de as pessoas decidirem por si mesmas as questões importantes.
Em seguida, um aluno levanta uma objeção relacionada: o descentralismo é para cidades pequenas; ele não funciona com populações grandes e densas. Mas essa objeção não tem mérito. O descentralismo é um tipo de organização social; ele não envolve isolamento geográfico, mas um uso sociológico específico da geografia.
Em aspectos importantes, uma cidade de cinco milhões de habitantes pode ser organizada de forma descentralizada, com muitas dezenas de comunidades únicas e a estrutura de uma metrópole movimentada.
Normalmente, na administração urbana moderna, as várias funções municipais — educação, emprego, correios, assistência social, saúde, polícia e tribunal de contravenções, habitação e controle de aluguéis, distrito eleitoral etc — são divididas em unidades apenas para conveniência administrativa da prefeitura. Distritos não se relacionam uns com os outros nem com os bairros. Um cidadão com negócios ou reclamações deve procurar o escritório distrital de cada departamento ou, talvez, ir até a prefeitura. E, da mesma forma, não há nenhum fórum possível para discutir a coordenação das várias funções, exceto no topo, com o prefeito ou perante o conselho.
Já a organização descentralista seguiria a realidade da vida em uma comunidade urbana, onde moradia, escola, compras, policiamento, serviços sociais e política estão integralmente relacionados. Cada bairro deve ter uma prefeitura local. Esses distritos administrativos poderiam ter uma autonomia considerável dentro da administração municipal que controla o trânsito, o saneamento, os museus etc, tudo o que tiver de ser centralizado por necessidade ou conveniência. Impostos poderiam ser coletados de forma centralizada e grande parte da arrecadação poderia ser dividida entre os bairros para ser orçada localmente.
Para o cidadão comum, a convergência de todos os tipos de negócios relacionados em um centro local não é apenas conveniente, mas deve levar a um maior conhecimento e envolvimento. Pessoas pobres, em especial, não sabem como se orientar, são atrapalhadas por formulários a serem preenchidos e não têm ajuda profissional; elas se sentem derrotadas ao lutar contra a prefeitura e logo desistem.
Além disso, cada bairro tem problemas interligados e peculiares próprios. Esses problemas podem ser razoavelmente enfrentados pelos cidadãos e pelas autoridades locais, mas se perdem na política interna das burocracias centrais, que têm interesses bem diferentes. Um bairro certamente deveria se policiar, de acordo com seus próprios costumes, e evitar a atual brutalidade policial padrão que tenta impor uma conformidade impraticável por toda a cidade.
Urbanismo
Um bairro assim constituído pode aprender a decidir sobre seu próprio desenvolvimento. Nos programas de renovação urbana, o governo federal segue a fórmula tradicional de equilibrar centralismo e descentralismo e solicita a aprovação dos planos pela comunidade local.
As cidades, portanto, criam "conselhos de planejamento" locais. Mas isso funciona da seguinte forma: ocasionalmente os bairros residenciais de classe média podem se organizar para impedir qualquer mudança; já as pessoas pobres ficam totalmente passivas em relação aos poderes constituídos; geralmente, os conselhos são meros carimbos para a prefeitura e empresários.
A participação de um bairro em seu destino só pode ser significativa se o bairro começar a ter consciência de si como uma comunidade. Para isso, o mero "consentimento" ou "participação" não é suficiente; deve haver uma medida de iniciativa e decisão real, baseada em conhecimento e confiança.
Entretanto, a questão não é se a descentralização funcionaria em populações urbanas densas, mas como fazê-la funcionar, pois isso é imperativo.
O aumento de doenças sociais e mentais urbanas se deve fundamentalmente à impotência, à resignação e à desistência. A única maneira em que as pessoas afirmam sua vitalidade é mostrando os sintomas. Autoridades centrais tentam lidar com a situação como zeladores severos ou higiênicos. Cidadãos respondem tornando-se "dependentes da comunidade" — na cadeia, no hospital, em programas de assistência; ou seja, tornam-se pacientes crônicos. Em muitos casos, isso ocorre há duas ou três gerações.
No entanto, algo mais precisa ser dito sobre grandes populações densas. Em minha opinião, há um limite de densidade e expansão urbanas além do qual nenhuma forma de organização social — centralizada ou descentralizada — é viável.
A aglomeração urbana cria um clima peculiar de excesso de relações sociais e um tipo de privação sensorial e emocional. Em vez de contato e comunicação, há barulho e isolamento. Não é diferente do que acontece com os roedores de ambientes superlotados nos experimentos de John Calhoun, que ficam confusos e morrem.
Por exemplo, a densidade populacional no Harlem central, 67 mil pessoas por milha quadrada, é quase três vezes maior que a da cidade de Nova York como um todo. Mesmo sem contar as outras condições desfavoráveis das pessoas negras, essa aglomeração em si é patológica, super-estimulante mas culturalmente empobrecedora, que destrói a privacidade, sendo excessiva e brutalmente policiada.
Nosso grau de urbanização está além do razoável. Neste país, temos os sintomas de uma "explosão populacional" ao mesmo tempo em que vastas e belas regiões rurais se tornaram despovoadas. Na configuração atual, apenas grandes operações com mão de obra migrante conseguem se dar bem na agricultura, e os subsídios agrícolas favorecem quase que exclusivamente esse grupo.
Com exceção de algumas vozes sinceras, mas impotentes, há um consenso geral de que a agricultura como meio de vida deve ser extinta. No entanto, nenhum esforço é feito para encontrar substitutos urbanos para a independência, as habilidades multifacetadas, o espírito comunitário e a família estendida, que eram os valores rurais.
Durante a Grande Depressão, o governo Roosevelt fez alguns esforços para apoiar a agricultura de subsistência, como fator de estabilidade social e para aliviar a miséria rural e urbana. Mas com o retorno da prosperidade, nada mais foi feito. (Permita-me dizer que havia um descentralismo desordenado em muitas partes do início do New Deal).
Natureza humana
Um aluno discorda veementemente dizendo que o descentralismo é humanamente irrealista, pois "deposita fé demais na natureza humana" ao se basear em motivos intrínsecos como interesse no trabalho e associação voluntária. Outro aluno menciona Rousseau, que ainda está academicamente fora de moda desde que foi refutado pelo professor Babbitt há uma geração (Jefferson também, agora, está recebendo suas críticas).
Essa objeção é notavelmente sem base. Minha experiência é que a maioria dos descentralistas é cética e implicante, e tende a seguir mais Aristóteles do que Rousseau. Devemos evitar a concentração de poder exatamente porque somos falíveis; quis custodiet custodes? ("quem vigia os vigilantes?").
A democracia, diz Aristóteles, deve ser preferida porque é a forma de governo "menos perversa", já que divide o poder entre muitos. Acho que o aluno inverte a questão moral de cabeça para baixo. A questão moral não é se humanos são "bons o suficiente" para um tipo de organização social, mas se o tipo de organização é útil para desenvolver as potencialidades de inteligência, graça e liberdade humanas.
Mais profundamente, é claro, a desconfiança da "natureza humana" é um conformismo ansioso. É preciso preservar a reputação, não cometer o menor erro; portanto, a pessoa se apega a uma função designada. Mas, infelizmente, quanto maior for a organização, mais será preciso preservar a reputação.
Por exemplo, podemos ver que o Peace Corps (Corpo da Paz) do governo é muitas vezes mais caro do que operações similares não oficiais, em grande parte porque um trabalhador esforçado de vinte anos pode se tornar um incidente internacional; então todo excesso é pouco na hora da seleção. A conveniência da supervisão prevalece sobre o desempenho. E quanto mais "objetivo", melhor: se o computador aprovar, ninguém é culpado.
Uma característica fatal dos empreendimentos descentralistas é sua variedade de procedimentos e pessoas; como é possível saber, com uma porcentagem de validade, que esses métodos e pessoas estão certos?
Moralmente, todos os estilos de organização social se autocomprovam, pois as pessoas entendem que há uma qualidade de estarem certas no modo como todos de fato se comportam. Mas estilos diferentes têm normas diferentes. O estilo centralizador gera tanto a conformidade mesquinha quanto a admiração pela grandeza.
Quanto mais rotineiras e impotentes são as pessoas, mais elas ficam hipnotizadas por provas externas de produção e poder. Um empreendimento projetado em pequena escala para atender a uma necessidade específica de determinadas pessoas passa a ser visto como se não fosse nada. Para ganhar atenção e apoio, ele deve se chamar "projeto piloto", prometendo aplicações grandiosas.
No entanto, ainda mais profunda do que essas confusões neuróticas, penso que há uma confusão autêntica em face das condições sem precedentes dos tempos modernos, que gera rigidez e medo de experimentos sociais. Um estudante diz: "Poderíamos nos dar ao luxo de fazer experimentos se não fossem os chineses, os cubanos, o índice de criminalidade, o desemprego, a corrida espacial, a explosão populacional."
O salto tecnológico, a urbanização galopante, as armas nucleares, o colapso do sistema colonial; tudo isso envolve ameaças e dilemas. A resposta inevitável das pessoas é aderir ao estilo de controle rigoroso dos especialistas. Em emergências, a organização centralista parece fazer sentido e, muitas vezes, de fato faz. Ela também é confortavelmente ditatorial.
Por fim, a objeção moral também é colocado de modo invertido: a descentralização é impossível não porque as pessoas sejam incapazes, mas porque os poderosos não permitem. (Esse aluno é do tipo "jovem furioso".)
Se admitirmos que, em algumas áreas, a descentralização é viável, como ela poderia ser realizada? Não podemos esperar que os poderes centrais deleguem autonomia, assim como não podemos esperar que os estados-nações abram mão de sua soberania e grandeza. Na verdade, a tendência é totalmente na direção oposta: em direção a corporações maiores, fusões e aquisições, em direção a horários e notas mais rígidos na educação, em direção ao aumento da padronização e à aplicação de tecnologias de automação computadorizada em todos os campos e, é claro, em direção ao aumento do poder em Washington para se tornar o maior proprietário, o maior patrocinador de pesquisas e o maior policial.
Tudo isso é inegável. No entanto, a situação não é algo tão preto no branco. Há também forças na outra direção. Devo presumir, por exemplo, que não é um acidente social o fato de eu estar escrevendo um livro sobre o tema da descentralização.
Associações voluntárias
Em princípio, há duas maneiras pelas quais um sistema super-centralizado pode se tornar mais misto. Ou associações voluntárias se formam espontaneamente devido a necessidades prementes para as quais o sistema central é irrelevante ou antipático, ou a própria autoridade central escolhe, ou é forçada, a construir partes descentralizadas, porque seu método simplesmente não está funcionando.
Certamente há grandes tendências sociais em direção a associações espontâneas do tipo "faça você mesmo". Já notamos a espontaneidade, o localismo e a federação descentralizada do movimento pelos direitos civis de pessoas negras, em oposição às táticas mais convencionais da Urban League e da antiga NAACP. Mas isso faz parte de uma disseminação geral de manifestações paralegais, boicotes e demonstrações de poder que expressam claramente a discordância com procedimentos formais que não são eficazes.
O ativismo da não violência é peculiarmente epidêmico; ele possibilita imediatamente uma ação a ser realizada, em vez de a pessoa ser meramente recusada — uma bela característica dele, talvez, seja recusar as autoridades —, mas não exige a formação de partidos políticos ou a organização de exércitos privados. (Quando a não violência é autêntica, de fato, sua própria ação é descentralista; ela faz com que a oposição volte a ser pessoas, mas não algo pessoal. A violência tem o efeito contrário).
O "faça você mesmo" pode ser para-institucional, se não for abertamente paralegal. Jovens recusados se retiram da economia. A off-broadway se retira da Broadway. Estudantes abandonam universidades famosas porque decidem que não estão sendo educados. Então eles formam, por exemplo, o Movimento Estudantil do Norte para dar aulas particulares a crianças urbanas prejudicadas; mas então o Movimento Estudantil do Norte decide que o currículo da escola pública também é inadequado, e os professores particulares ensinarão de acordo com suas próprias luzes. O Freedom Now estabelece o que equivale a um "para-partido" no Mississippi.
Há um tom semelhante na estrutura política. Em contraste com os movimentos de "reforma" mais antigos, que se dedicavam a expurgar os patrões e os corruptores, os novos movimentos de reforma urbana rapidamente se constituem especificamente para um objetivo concreto, geralmente para bloquear invasões ultrajantes de governos ou grandes instituições. Infelizmente, eles não costumam ter um contraprograma; param após exercerem um veto, perdem força e acabam perdendo a questão de qualquer modo.
Todo esse tipo de fermentação é o que Arthur Waskow chama de "desordem criativa".
Mas também, em minha opinião, a força surpreendente dos movimentos "know-nothing" (influente corrente reacionária) no país se deve principalmente a uma justificada insatisfação com a centralização. É exatamente o que afirmam quando reiteram o slogan "o governo não deve fazer o que as pessoas podem fazer por si mesmas". Por "pessoas", nossos amigos reacionários parecem se referir principalmente a corporações, que não são pessoas; mas não acho que liberais e progressistas estejam prestando atenção à queixa subjacente, a perda da autodeterminação.
Liberais repetem com naturalidade que os problemas complexos dos tempos modernos não permitem soluções simplistas. Mas qual é a utilidade de soluções sobre as quais não se tem voz e que, por fim, não são as soluções para os problemas em questão? Não noto nenhuma disposição significativa dos poderes centrais para se descentralizarem.
Em vez disso, sua disposição, quando a organização começa a ranger, é ampliar ainda mais a centralização, com adição de novos escritórios centralistas e supervisores; com uma paralisação que nomeia comitês sem poder; com desconsideração pelas dificuldades, esperando que desapareçam; chamando os casos difíceis de "desvios" e colocando-os fora de circulação.
No entanto, há exemplos reais que mostram como a descentralização pode ser incorporada.
A gerência de uma corporação gigantesca — a General Motors é o exemplo clássico — pode decidir, com astúcia, delegar certa autonomia a suas partes corporativas, pois um empreendimento mais flexível é mais lucrativo no longo prazo. Ou uma grande fábrica física pode ser geograficamente dispersa e um pouco descentralizada, para economizar nos custos de mão de obra e obter melhores incentivos fiscais. Naturalmente, esses motivos não têm nada a ver com a grande maioria dos subordinados.
Mais interessante para nossos propósitos é a aplicação multifacetada da psicologia industrial. Em sua maioria, esses psicólogos são descentralistas e ensinaram uma sabedoria oposta ao "gerenciamento científico de negócios". Em vez de subdividir ainda mais o trabalhador, eles têm insistido na eficiência de permitir mais opções e liberdade, pedindo sugestões de baixo para cima, aumentando o "pertencimento".
Para dar um exemplo típico: descobriu-se que, a longo prazo, é mais produtivo que meia dúzia de operários montem um grande torno do início ao fim, e tenham a satisfação de vê-lo ser transportado, do que subdividir a operação em uma linha.
Não é preciso dizer que nossos psicólogos industriais não podem encaminhar suas intuições até sua conclusão lógica na gestão dos trabalhadores. Mas essas questões sobre diferentes departamentos não são triviais. Considere o seguinte exemplo.
Em algumas áreas da Inglaterra, é tradicional trabalhar por meio de um contrato coletivo ou de grupo. (Isso foi estudado pelo professor Melman, da Universidade de Colúmbia.) Um grupo de trabalhadores concorda em concluir em um determinado período uma certa quantidade de trabalho por peça, pelo qual recebem uma quantia em dinheiro dividida igualmente. O capitalista fornece o maquinário e os materiais, mas todo o resto — regras de trabalho, métodos, cronograma, contratação — é deixado para o grupo decidir.
Esse arranjo tem se mostrado viável em trabalhos altamente qualificados, como construção civil, e em trabalhos semiqualificados em linhas de montagem de automóveis. O grupo pode ser de meia dúzia ou de alguns milhares.
Em termos humanos, o arranjo tem vantagens extraordinárias. Os homens trocam de emprego e adquirem muitas habilidades; ajustam o cronograma de acordo com sua conveniência (ou prazeres); trazem e treinam aprendizes; inventam dispositivos de economia de mão de obra, já que é vantajoso para eles aumentar a eficiência; substituem uns aos outros quando estão doentes ou em férias especiais.
Obviamente, esse sistema, tão surpreendentemente diferente de nossa regulamentação de cima para baixo, da disciplina do relógio de ponto, dos detalhes do sindicato e do espírito competitivo, é difícil de ser incorporado à maior parte de nossa indústria. No entanto, ele seria adequado para grande parte dele e faria uma profunda diferença. Onde seria adequado? Como poderia ser adaptado?
Uma tentativa de incorporar a descentralização está ocorrendo atualmente no sistema escolar de Nova York. Devido a uma combinação envolvendo algo próximo da insurreição em bairros pobres, alguns escândalos espetaculares e os holofotes pós-Sputnik sobre atualizações e melhorias, foi nomeado um novo e muito bom conselho.
Decidindo que o sistema é excessivamente centralizado, as pessoas desse Conselho ressuscitaram vinte e cinco distritos locais — com uma média de quarenta mil crianças cada! — e nomearam conselhos locais com poderes bastante abertos, para servir de ligação com os bairros.
Mas, diferentemente do caso dos conselhos de planejamento de renovação urbana mencionados antes, a intenção é delegar poderes positivamente. De forma nenhuma, esse grupo de pessoas com intenções notavelmente fortes, que foi nomeado para os conselhos escolares, tem a intenção de ser um mero carimbador.
No momento, há uma disputa por posição e poder. Os conselhos locais têm o poder de realizar audiências orçamentárias e "sugerir" a alocação de dinheiro. O que isso significa? Eles poderiam sugerir a eliminação de alguns currículos e serviços e a substituição por outros? Alguns membros do conselho local querem descentralizar radicalmente, tornando os superintendentes de campo e os conselhos locais quase autônomos dentro do sistema maior — o que é razoável, já que os diferentes bairros têm condições diferentes e, portanto, necessidades curriculares, de pessoal e de serviços diferentes.
Um dos conselhos de Manhattan, curioso para saber o que seus conselhos irmãos estavam fazendo, convocou uma reunião com os cinco conselhos de Manhattan e eles concordaram em trocar atas. Imediatamente, o conselho central protestou e proibiu essas tentativas de federação. "Se vocês emitirem declarações conjuntas", apontaram, "as pessoas pensarão que vocês falam em nome do sistema escolar".
"Mas o que vocês podem fazer a respeito?", perguntaram os moradores locais; "já que vocês nos chamaram, nós viemos e, já que viemos, pretendemos agir". Menciono esse incidente não porque ele seja importante em si, mas porque toca o cerne da questão constitucional sobre centralização e descentralização.
Essas são, portanto, as objeções iniciais ("prima facie") levantadas pelos estudantes universitários.
A descentralização é desordenada e "anárquica". Não é possível descentralizar o controle de tráfego aéreo e a saúde pública. E quanto à automação? A descentralização é uma ideologia camponesa. Ela torna os "direitos dos estados" injustos. É impraticável com populações grandes e densas. Implica uma fé irrealista de que a natureza humana é boa. É impossível ir contra a tendência avassaladora de aumento de tamanho e poder.
É desanimador que, nessas discussões, os alunos continuem se referindo ao "meu sistema" ou ao "sistema descentralista". Mas não estou propondo um "sistema". É difícil convencer estudantes universitários de que é improvável que exista um único estilo apropriado de organização ou economia que se adapte a todas as funções da sociedade, assim como é improvável que exista um único modo de educação ("ir à escola") que sirva para quase todo mundo, ou que exista um comportamento "normal" que seja saudável para quase todas as pessoas.
Parece-me o seguinte: estamos em um período de excesso de centralização. É demonstrável que, em muitas funções, esse estilo é economicamente ineficiente, tecnologicamente desnecessário e humanamente prejudicial. Portanto, devemos adotar uma máxima política: descentralizar onde, como e quanto for conveniente. Mas onde, como e quanto são questões empíricas; elas exigem pesquisa e experimentos.
No atual clima de opinião excessivamente centralista, é exatamente essa pesquisa e esse experimento que não estamos fazendo. Entre todos os departamentos, agências e comissões em Washington, não ouvi falar de nenhum que aborde o tipo de organização de municípios, assistência social, manufatura, comércio ou educação, em termos de sua eficiência técnica e econômica, e seus efeitos sobre as pessoas. Portanto, peço aos alunos que estão fazendo pós-graduação que escolham suas teses nesse campo.