Floresta é o Nome do Mundo (The Word for World Is Forest, 1972) é uma das consagradas ficções da imortal Ursula K. Le Guin. Ganhou o prêmio Hugo, talvez o mais importante da literatura de ficção científica. Como o nome e capa (da bela edição da Morro Branco) sugerem, é uma história ecológica.
Hoje, 52 anos depois da publicação, a sinopse pode soar batida: homens com as piores intenções aterrizam num planeta de natureza prístina e são confrontados pelo povo nativo alienígena. Sim, como em Avatar. Mas, além de ter surgido meio século antes, Floresta tem um foco intimista e psicológico.
A tragédia básica por trás desse contexto interestelar é a velha e recorrente exploração geno-ecocida — também muito viva fora da ficção, principalmente em regiões onde ainda há florestas e indígenas, como o Brasil.
O que faz toda a diferença é Le Guin, com sua sutil sensibilidade para interações entre corações e mentes, o olhar mágico da natureza e o poder de tocar, despertar e refletir uma sabedoria interna até então dormente.
O livro ficou mais relevante do que nunca. Diante da realidade atual, os exploradores da história parecem saltar das páginas mais vivos, devido à espantosa semelhança com a infecção de extrema-direita que vem se disseminando pelo planeta.
O modo como Ursula pinta o mundo natural e suas interconexões é dos mais cativantes. Durante essas cenas, eu precisava parar e respirar, como se estivesse entrando em um estado alterado de consciência.
O pano de fundo é a mesma cosmologia hainiana de outras dezenas de livros e contos da autora, entre eles os amados A Mão Esquerda da Escuridão e Os Despossuídos — os maiores clássicos sci-fi sobre fluidez de gênero e anarquismo, respectivamente. Hain é a civilização galática mais antiga desse universo, sendo a origem da vida em diversos planetas, entre eles a Terra.
Conto relacionado
Floresta estava na minha lista de leitura há anos. O que ativou um impulso irresistível de finalmente lê-lo foi outra ficção ecológica de Ursula: o conto Vaster Than Empires and More Slow (1971).
Está pulsando até agora dentro de mim. É uma despedaçadora e magnífica história sobre despertencimento, natureza e redenção, também nesse universo hainiano. Uma mistura de Solaris com aqueles mitos imemoriais sobre chegar ao verdadeiro lar. Faz parte de coletâneas como The Wind’s Twelve Quarters ou The Big Book of Science Fiction.
Uma dica para quem for ler: a referência do título completa e expande muito o conto. É uma frase de um poema romântico e metafísico do século 17:
My vegetable love should grow
Vaster than empires and more slow;
Imperdível para quem gosta de ficção científica e ecologia.
Outros livros de Ursula K. Le Guin:
- A mitologia de ‘Game of Thrones’ e ‘Terramar’A mitologia de ‘Game of Thrones’ e ‘Terramar’
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